Somos todos iguais? Os episódios discriminatórios dos últimos dias

Nos últimos dias, temos visto no Brasil – e também no cenário internacional – questões que colocam em evidência a necessidade de efetivação e proteção dos Direitos Humanos.
O movimento por igualdade e reconhecimento emerge por razões históricas que muitas pessoas tentam negar. Dentro do país, justamente no mês de maio, que marca a abolição da escravatura há 132 anos, muito temos a pensar, refletir e reivindicar.
De acordo com a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965), “a expressão ‘discriminação racial’ significa qualquer distinção, exclusão restrição ou preferência baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tem por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício num mesmo plano (em igualdade de condição), de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública.”
Esse documento internacional evidencia que o ponto para compreender o significado de discriminação está justamente na diferenciação de tratamento entre as pessoas em razão da raça, da cor, da descendência ou origem nacional ou étnica e, ainda, adverte que tal comportamento pode implicar na anulação ou restrição do reconhecimento, gozo ou exercício em igualdade de condições de direitos, nas suas mais variadas formas.
E é exatamente isso que os últimos acontecimentos mostram para nós.
No dia 18 de maio, o menino João Pedro foi baleado dentro da sua própria casa enquanto brincava com amigos no quintal. Notícias dão conta que os meninos correram para dentro da casa quando avistaram uma aeronave sobrevoando o local, o que teria sido considerado suspeito pelos policias que desferiram 70 tiros contra o local.
Muitas crianças negras têm medo de sair de suas casas para brincar por causa da violência e, principalmente, em razão da violência do Estado que as marginaliza por um estereótipo. E se os meninos fossem brancos, isso teria acontecido? O que fez com que os policiais suspeitassem dos meninos? A cor? Até quando isso vai acontecer?
É preciso reafirmar os compromissos assumidos no que se refere à progressivamente, a eliminar a discriminação racial.
Outro caso que ganhou repercussão dentro do país foi o caso da jovem Ndeye Fatou Ndiaye no qual estudantes de uma escola particular situada em Larangeiras, zona sul do Rio, escreveram mensagens racistas com ofensas em razão da cor da sua pele.
No cenário internacional, o noticiáiro mostrou, nesta semana, mais um caso que parece ter sido motivado por discriminação racial ocorrido em Minneapolis, Minnesota, nos Estados Unidos. Em uma abordagem policial, o americano George Floyd, um homem afro-americano de 46 anos, morreu de complicações cardíacas decorrentes de asfixia mecânica. No momento, um policial colocou o joelho sobre o pescoço de Floyd para imobilizá-lo, fazendo com que ficasse sem respirar durante certo tempo, apesar de ter ouvido várias vezes: “Não consigo respirar”.
Vários protestos ocorreram por todo país, fazendo com que, mesmo em meio a uma pandemia, americanos fossem às ruas manifestar sua indignação pela morte de Floyd. Fato que merece destaque nas manifestações dos EUA refere-se à barreira de pessoas brancas feita entre manifestantes e policiais, demonstrando que pessoas brancas têm menos chances de sofrerem violência do Estado.
Vale dizer que a Lei – em seu sentido formal – diz que todos somos iguais, mas a nossa realidade é outra. As situações vivenciadas pela população negra cotidianamente revelam uma série de violações aos seus direitos mais básicos.
O Estado deve atuar em duas vertentes: a) proibir qualquer forma de discriminação racial; e a) promover políticas compensatórias que levem à igualdade substancial.
O que se percebe diante dos fatos é que a atuação do Estado está longe dos compromissos anteriormente firmados.
O Brasil e o EUA, por meio dos acordos internacionais, deveriam condenar a discriminação racial e comprometer-se a adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, uma política de eliminação de todas as formas de discriminação racial e de promoção da harmonia entre todas as raças, afinal esses são os termos dos acordos que são signatários.
Em terras tupiniquins, a harmonia racial é mito. Fechar os olhos para as diferenças só acentua as desigualdades. Por isso, devemos estar alertas aos acontecimentos, perceber que representatividade importa e políticas compensatórias são necessárias e, sobretudo, cobrar do Estado faça a sua parte.
É preciso lembrar das palavras de Angela Davis: “Não basta não ser racista, é preciso ser anti-racista”.

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A manutenção do calendário do ENEM e as desigualdades sociais no Brasil

Estão abertas as inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

O ENEM representa a esperança de transformação com expectativa de ingresso em uma universidade, mas tornou-se um desafio. Para muitos será uma grande frustração.

Criado em 1998, o ENEM visava proporcionar a avaliação de desempenho de estudantes do Ensino Médio de instituições públicas e privadas. A partir de 2009, o referido exame passou também a exercer a função de selecionar os estudantes para diversas instituições de ensino superior, conjuntamente a outros programas do Governo Federal, como o Sisu, Prouni e Fies.

A utilização do ENEM e a implementação de tais programas têm como função essencial promover a democratização do ensino superior no Brasil, ampliando a possibilidade de acesso a pessoas que não tinham oportunidades para ingressar em cursos superiores.

Com a implementação do ENEM/SISU, muitas universidades que antes adotavam os vestibulares próprios para selecionar seus alunos, passaram a utilizá-los, gerando uma janela de oportunidades para muitos estudantes que poderiam concorrer a vagas de todo o país sem se deslocar, já que a forma antes utilizada acabava privilegiando aqueles que podiam arcar com os custos de tais deslocamentos.

No entanto, no presente ano de 2020, com a Pandemia do Covid-19 (Coronavírus), diversos problemas sociais agravaram-se, dentre eles, a desigualdade educacional.

Segundo Lacerda (2017):

Existe a desigualdade de não ter acesso ao sistema escolar, existe a exclusão dentro do próprio sistema, existem acessos a padrões diferentes de qualidade educacional e existe a desigualdade de tratamento – quando estudantes têm acesso a condições muito desiguais da oferta educacional, que deveriam ser, no mínimo, igual para todos. E o pior, e consequência dos fatores acima: a desigualdade de conhecimentos adquiridos.

Todas essas formas de desigualdades já existentes no país potencializam-se nesse momento. Fato é que a desigualdade educacional relaciona-se à desigualdade econômica, assim como a desigualdade econômica impacta na desigualdade educacional.

A necessidade de isolamento social fez com que instituições de ensino se reinventassem rapidamente, promovendo aulas e atividades à distância no formato EAD ou por meio da virtualização de aulas ao vivo.

É possível notar a importância da tecnologia nos últimos dias. Apesar do distanciamento, a comunicação continua acontecendo, assim como as aulas para grande parte da população.

Qual é problema então? Muitas instituições públicas não virtualizaram suas aulas nem migraram para o EDA durante a pandemia. E mesmo que o fizessem, seus alunos não conseguiriam acessar as plataformas de ensino.

Não se pode desconsiderar que grande parte da população brasileira nesse momento não tem acesso ao básico recomendado pelos órgãos públicos e internacionais como ter acesso a água, sabão, máscaras etc.

No atual contexto, como pensar que todos conseguem acompanhar aulas virtuais? Se a preocupação imediata das pessoas é com sua alimentação e sobrevivência, como pensar que a manutenção do calendário do ENEM cumprirá seu papel de democratizar o acesso a TODOS os estudantes?

Mediante o imenso quadro de exclusão social a que está submetida grande parte da população brasileira, a educação exerce o papel de dar uma expectativa positiva para viabilizar oportunidades, possibilitar mobilidade social e concretização de sonhos (CASTRO et al., 2017).

Manter o calendário do ENEM não seria privilegiar uma camada da população e fechar os olhos para as desigualdades sociais e educacionais do nosso país?

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Referências:

CASTRO, Bianca Gomes da Silva Muylaert Monteiro de; RANGEL, Etuany Martins; CASTRO, Maria José Gomes da Silva; BORGES, Luís Felipe Câmara; AMARAL, Shirlena Campos de Souza. A política de cotas como mecanismo de enfrentamento à pobreza e democratização do ensino superior: uma análise dos efeitos da desigualdade educacional no exercício da cidadania e na justiça social brasileira. Linkscienceplace, Nº 3, volume 4, article nº 12, April/June 2017. Disponível em: http://revista.srvroot.com/linkscienceplace/index.php/linkscienceplace/article/view/384

Lacerda, Pilar. As desigualdades educacionais no Brasil: enfrentando-as a partir da escola. 2017. Disponível em https://educacaointegral.org.br/reportagens/desigualdades-educacionais-no-brasil/. Acesso em 11 de maio de 2020.

Bem-vindos!

A ideia de criar um blog surgiu da necessidade de um espaço mais próximo e concreto de conexão por meio da escrita.

Com a reconfiguração do mundo do trabalho e das relações sociais nesse período de isolamento social, a troca de ideias ganhou amplitude na rede virtual, dando brechas e oportunidades para que várias pessoas exponham seus pontos de vista.

O nome do Blog surgiu justamente da busca pela análise dos diversos pontos de vista existentes, nesse momento em que se vive uma “exacerbação do eu” como afirmam Leandro Karnal e Monja Cohen no livro “O inferno somos nós”. Atualmente, verifica-se o aumento da intolerância e do desrespeito à diversidade. Muitas pessoas acreditam que apenas suas ideias estão corretas e nem ao menos tentam entender racionalmente a justificação de seus próprios argumentos.

Logo o povo brasileiro, conhecido por sua cordialidade e calor humano, um povo diversificado por natureza e que afirma orgulhar-se de sua nacionalidade e características positivas, parece caminhar em meio a uma cultura de ódio.

Nesse sentido, por meio da etimologia da palavra “relativize”, busca-se exatamente evidenciar que é preciso “considerar (algo) sob um ponto de vista relativo e não absoluto”.

Mais do que apresentar ideias, o que se busca nesse espaço é a construção das ideias.

“Relativizar” aparece aqui por outro motivo, simbólico, considerando o livro “Relativizando” do antropólogo Roberto Damatta (2010), primeiro livro de ciências sociais que tive contato na graduação em Ciências Sociais da UFF e que, posteriormente, tornou-se leitura obrigatória em todas as turmas de Sociologia que lecionei.

Partindo de uma comparação aparentemente simples – o fato de comer um bolo – o autor demonstra as várias justificações e motivações que compõe as ações humanas.

Nessa perspectiva, entende-se que é preciso relativizar para entender outros pontos de vista, para entender os fatores que propiciam sua existência e para questionar sua validade e veracidade. Em um tempo em que a capacidade crítica parece restringir-se cada vez mais, tem-se como ideia central reavivar o espírito questionador de cada leitor para que seja possível despertar as curiosidades adormecidas e, sobretudo, pensar na sociedade brasileira contemporânea a partir de suas múltiplas realidades.

Significado de relativizar:
Descrever algo relacionando uma coisa com outra;
Não admitir ou tomar como absoluto, completo, restrito;
Relativizar um problema;
As questões se relativizaram com a nova teoria.

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